Plano Ferroviário Nacional : comboios noturnos internacionais também devem ser prioridade


Contributo da campanha ATERRA para a consulta pública do Plano Ferroviário Nacional

Durante as últimas décadas, as elites políticas e económicas têm utilizado o setor dos transportes para enriquecer, mais do que para responder às necessidades das pessoas e do planeta.

Portugal é hoje o único país europeu com mais quilómetros de autoestradas do que de ferrovia ativa.

Enquanto se somam casos de corrupção e de abuso, das parcerias público-privadas rodoviárias às subvenções à aviação, as promessas de investimentos na ferrovia são adiadas ou ficam por cumprir.

Enquanto nos estão a impor uma expansão da capacidade aeroportuária do país (em vez da necessária redução), as principais ligações ferroviárias internacionais estão há três anos suspensas.

O avião é um meio de transporte usado, a nível mundial, apenas por uma pequena elite, é aquele que mais polui, e cujo impacto climático mais tem crescido. O nosso futuro depende de fazermos decrescer a aviação.

Desejamos e necessitamos de um setor dos transportes que preste um serviço público a toda a população e respeite a Vida no planeta. Nele, a ferrovia tem um papel central. Torná-lo realidade não depende das promessas dos governos, mas da mobilização de todas as pessoas, a todos os níveis da sociedade.

Os comboios noturnos na Península Ibérica, em 2009 e atualmente

Prioridade ao comboio noturno

Desde que o Sud Expresso (Lisboa – Hendaye – Lisboa) e o Lusitânia (Lisboa – Madrid – Lisboa) foram suspensos em 2020, mais de 8500 pessoas já assinaram uma petição internacional para voltar a ligar Portugal à Europa Central por comboios noturnos.

Os comboios noturnos são a opção mais cómoda e ecológica para viagens de média e longa distância. São o futuro das viagens internacionais na Europa. Num momento em que se está a construir uma rede europeia de serviços noturnos, com a cooperação entre vários operadores e com novas ligações como Paris-Hendaye, Berlim-Paris ou Zurique-Barcelona, um Plano Nacional Ferroviário digno desse nome deve procurar fazer parte ativa dessa rede, em vez de manter Portugal isolado.

A viagem Madrid – Barcelona (distância semelhante a Lisboa – Madrid) de comboio emite 15 vezes menos CO2 do que em avião (ecopassenger.org). Se considerarmos as restantes emissões nocivas da aviação, o impacto climático do comboio é cerca de 30 vezes inferior.

Recuperar e desenvolver a rede ferroviária nacional implica recuperar e desenvolver a ligação à rede ferroviária europeia. Para tal, os comboios noturnos internacionais devem ser uma das prioridades.

Devem ser acrescentadas ao PFN propostas de implementação imediata, com retoma dos seguintes serviços:

  • Lisboa – Hendaye – Lisboa (Sud Expresso)
  • Lisboa – Madrid – Lisboa (Lusitania). Independentemente da nova linha Évora – Elvas, que facilitará a circulação de comboios diurnos, ligações noturnas fazem sentido, por poderem ser implementadas de imediato, e continuarão a fazer sentido, uma vez que permitem aproveitar toda a jornada no local do destino.
  • A retoma das ligações noturnas a partir de Lisboa deve incluir a retoma das ligações Porto – Madrid e Porto – Hendaye, através de ligação em Coimbra.
  • A médio-curto prazo, dever-se-á estender os serviços noturnos a partir do Porto e de Lisboa até Barcelona, para deixar de haver necessidade de ligações aéreas dentro da Península Ibérica.
  • A implementação de uma ligação noturna Braga – Faro – Braga reprsentará um contributo para o fim imediato dos voos domésticos em Portugal Continental, inaceitáveis já hoje – não apenas a partir de 2050.
  • A concretização da linha prevista no PNF desde o Algarve até Sevilha e Valência deve dar origem a uma ligação noturna internacional de Faro a Barcelona via Sevilha e Valência.
    Quaisquer investimentos previstos em linhas de Alta Velocidade devem, forçosamente, incluir serviços noturnos que liguem Portugal diretamente a países como Inglaterra, Países Baixos, Itália, Bélgica, Suíça, Luxemburgo e Alemanha.

Face ao inevitável decrescimento da aviação, a aposta nos serviços noturnos é uma visão de futuro com garantias de retorno, e pode ser feita em exclusivo pela CP, em cooperação com a Renfe e outras operadoras, ou por novas cooperativas ferroviárias. Deve ser definido o investimento e os apoios públicos para esses projetos, desviando os atuais apoios abundantes ao setor da aviação, incompatíveis com qualquer política climática, a começar pelas isenções de IVA e de ISP ao combustível de aeronaves.

Em vez de implementar mais cortes nos serviços noturnos, como aconteceu ao longo das últimas décadas, é preciso investir nos serviços a bordo dos comboios e nos serviços complementares a nível das estações e acessos, para permitir tirar o máximo proveito deste meio de transporte.

A título de exemplo, são de referir: serviços de refeições, duche nas estações. wifi, transporte de bicicletas e serviço de aluguer de bicicletas nas estações, transporte de animais de companhia, espaços e eventos culturais a bordo e nas estações. É fundamental garantir a articulação com serviços públicos de autocarros e de automóveis coletivos.

 

O projeto de um destino de viagens sustentável para Portugal, ou passará pelo acesso à rede europeia de comboios noturnos, ou continuará a ser apenas greenwashing.

Viajando de comboio noturno, todos os destinos ficam, confortavelmente, a uma hora de distância: meia hora para adormecer, meia hora para acordar.

 

ATERRA – Night Trains / Comboios Noturnos from RANNA on Vimeo.

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