erótico


1. Domingo, 25, a história é esta: esteve para acontecer em maio, mas já aqui escrevi sobre coincidências e planos que se reescrevem e sempre batem certo, é aceitar o acaso objetivo. Abrimos a semana do segundo aniversário da livraria com mais um encontro The Cursed Assembly às 16h, para falar do livro Parable of the Sower de Octavia E. Butler. São ainda constantes para muitas pessoas os problemas e pressões colocados pela religião como se não tivéssemos sido nós a inventá-la e, portanto, como se não fôssemos capazes de a reinventar. É possível viver sem religião, claro, mas, para quem a quer, esta obra de 1993 coloca essa questão: que outra crença seria essa, à nossa imagem, mutável como nós, adaptável como nós?

2. Segunda, 26, a história é esta: estamos há um ano a organizar na livraria conversas sobre literatura. No verão de 2022 lemos literatura portuguesa de 1875 a 1926, na primavera de 2023 lemos de 1926 a 1974, no outono de 2022 lemos de 1974 a 2022 e no inverno de 2023 lemos literatura brasileira de 1890 a 2021. Começa um novo ano e, apesar de não termos esgotado os textos portugueses (a eles voltaremos), por agora vamos viajar um bocadinho, trocar outras referências, ver o que acontece. O que se mantém é o facto de isto não ser uma aula porque não há professores a dá-la ou porque todas as pessoas presentes o são, umas para as outras. Este verão, lemos e bebemos do eros dos clássicos grecolatinos. Até 31 de julho, seis segundas às 18h.

3. Terça, 27, a história é esta: Kitya Mark entra-nos na livraria há umas semanas com a sua primeira zine na mão, acabada de fazer, e pergunta-nos se a queremos ler. Chama-se The Pride Flag Above the Prison, abrimo-la e percebemos o que temos em mãos. Ela pede uma fotografia nossa para enviar à mãe no Reino Unido (odiamos tirar fotografias assim, mas fazemo-lo). Uns dias depois, convidamo-la para esta conversa, terça às 18h. Em inglês, o Ricardo falará com ela sobre objetos bons ao toque e a bandeira arco-íris sobre a prisão (sex, life, healing, sunlight, nature, magic, serenity, spirit) que não serve para nada se não for vista pelas pessoas que lá estão dentro. Depois a Kitya regressa a casa, não sabemos se a voltaremos a ver.

4. Quarta, 28, a história é esta: quando abrimos a livraria, a 28 de junho de 2021, depois do segundo confinamento, mas ainda em pandemia, não fizemos inauguração. Era segunda-feira, simplesmente abrimos a porta às 10h e começámos a trabalhar. Nesse dia vendemos 10 livros: 6 para adultos (entre eles, o Dicionário da mitologia grega e romana de Pierre Grimal, edição Antígona; o Manifesto contra-sexual de Paul B. Preciado, edição Orfeu Negro; O livro branco de Jean Cocteau, edição Sistema Solar; e Ruinenlust de Ricardo Marques, não edições) e 4 para crianças (entre eles, um dos meus preferidos que nestes dois anos esgotou, mas está novamente disponível: o Mulheres e homens da Equipo Plantel, edição Orfeu Mini).

Um ano depois, no primeiro aniversário, e apesar de também termos planeado uma semana inteira de eventos, para o 28 decidimos não marcar nada: foi dia de estar apenas na livraria e receber as pessoas para um abraço de fim-de-tarde, uma Reinauguração a bem dizer. Não vos vou mentir e embelezar a história: vimos muita gente ao longo da semana, mas nesse dia só brindámos à porta da livraria com o sol de verão das 18h e um casal amigo que nos ofereceu de presente os primeiros marcadores amarelos da livraria. Foi tão bonito quanto podia ser. Este ano, e porque erro repetido é ritual, voltamos a não marcar nada para 28. Venham abraçar-nos durante o dia ou na última hora. Em vez de marcadores, teremos outra surpresa.

5. Quinta, 29, a história é esta: a Odete e a Regina Guimarães não se conheciam. E eu e o Ricardo achamos que elas tinham de se conhecer porque o trabalho e a vida que vemos em ambas comunica, mesmo sem elas saberem. No ano passado, foram muito generosas e aceitaram vir conversar à aberta. Chamámos-lhe A primeira vez porque era a primeira vez que se viam. Trocaram livros, falaram do Serviço Nacional de Saúde, de água e de todas as relações serem eróticas. Entretanto passou um ano, ambas continuaram a trabalhar e a viver (intensamente). Sabemos que não se cruzaram de novo. Perguntámos se queriam vir cá novamente falar uma com a outra, pôr os olhos, as mãos e o cabelo em dia. Ambas aceitaram. É às 18h, chamámos-lhe A segunda vez.

6. Nenhuma lista esgota nada, mas esta termina hoje. Comecei a 6 de janeiro, o dia a seguir ao meu aniversário, a compilar sugestões de cinema queer desde os anos 10 do século XX. Dos milhares de filmes que tenho em listas, foi por vezes muito difícil manter-me nos seis por década. (Para quem não tem acompanhado, o querido Ricardo Branco criou um letterboxd e tem reunido os títulos aqui.) A de hoje é a mais temporária de todas porque, convenhamos, ainda só vamos em três dos loucos anos 20 do século XXI (e imaginem). Voltaremos a fazer contas daqui a uns tempos, trocar outras referências, ver o que acontece. Então, a história é esta: Uma escolha muito pessoal de seis longas da década de 2020, para terminar (por agora)

, The Bloodhound (Patrick Picard 2020)

, Große Freiheit – Great Freedom (Sebastian Meise 2021)

, The Power of the Dog (Jane Campion 2021)

, Benediction (Terence Davies 2021)

, Close (Lukas Dhont 2022)

, Tár (Todd Field 2022).

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